Desde as primeiras discussões sobre a criação do HIDS (Hub Internacional para o Desenvolvimento Sustentável), o projeto suscitou uma série de estudos em várias áreas. Em 2020, durante a pandemia, um grupo de professores da FECFAU da Unicamp idealizou o primeiro programa de primeira residência em arquitetura oferecido pela Faculdade de Arquitetura, a Especialização em Arquitetura, Urbanismo e Engenharia Civil (Curso 90E). Contou com a participação de 15 alunos (10 deles com bolsas financiadas pela Reitoria da Unicamp) que desenvolveram estudos e um projeto final sobre o HIDS.
Desde então, alunos regulares da FECFAU têm escolhido o HIDS como objeto de estudos e de desenvolvimento de projetos. Uma delas é a agora arquiteta recém-formada pela Unicamp, Kelly Higajo Mishima. Para o seu Trabalho Final de Graduação (TFG), sob orientação da professora Gabriela Celani, ela elaborou o projeto do Entreterras: Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Agroalimentar. “Um programa arquitetônico relacionado à inovação, como é o caso do HIDS, é algo relativamente novo e, por isso, um desafio interessante para os alunos no final do curso. Exige que eles façam pesquisas aprofundadas sobre o tema, além de um bom levantamento de estudos de caso, o que resulta em um diferencial na formação deles”, pontuou Celani.
O HIDS está sendo idealizado para ser um distrito de inovação inteligente dedicado à geração de soluções para os desafios do desenvolvimento sustentável. Com uma área de 11,3 milhões de m2, o HIDS engloba o Polo 2 de Alta Tecnologia (Ciatec 2), o campus Zeferino Vaz da Unicamp e o campus 1 da PUC-Campinas. O HIDS Unicampé a área do HIDS que pertence à Unicamp, com um total de 1,4 milhão de m2, contígua ao campus da Universidade, no Distrito de Barão Geraldo, em Campinas.
Foi a partir desta premissa que Kelly Mishima idealizou o Entreterras, um espaço voltado para a geração de soluções inovadoras para uma produção de alimentos sustentável e inteligente, capaz de potencializar o intercâmbio de conhecimentos entre o saber popular e o conhecimento científico. “O Centro foi pensado para atuar como um elo entre diversos atores, incluindo associações de produtores e agricultores, pesquisadores, empresas do setor alimentício, centros de pesquisa e estabelecimentos comerciais de Campinas”, explicou a arquiteta que vê esta integração como chave para criar uma rede colaborativa capaz de fortalecer a produção sustentável de alimentos e, ao mesmo tempo, impulsionar a inovação neste setor.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), há uma expectativa de que cerca de 70% da população mundial esteja vivendo em cidades até 2050, uma situação crítica considerando que 70% de todos os suprimentos de alimentos já são consumidos por moradores urbanos, e o número está aumentando. Ainda de acordo com a FAO, ao investir na transformação dos sistemas alimentares e da agricultura, os países podem lucrar cerca de 15 vezes o investimento inicial, criando oportunidades de negócios e novos empregos. Embora as principais áreas de produção estejam localizadas em perímetros rurais, a expansão dos sistemas alimentares e da agricultura para as cidades pode contribuir para um ambiente mais resiliente, diminuindo a insegurança alimentar e nutricional.
Para definir a localização do prédio, Mishima utilizou os parâmetros do Plano de Ocupação do HIDS Unicamp e sugeriu que o Centro fosse construído entre uma das nascente do Ribeirão das Anhumas (com suas faixas de proteção ambiental) e as linhas de transmissão de energia (linhão), uma área com declives, que pode ser utilizada como campo experimental para Agricultura Periurbana e Sistemas Agroflorestais (SAFs). “A proposta sugere uma rede de áreas verdes organizadas em terraços que seguem as curvas de nível do terreno, combinando a produção de alimentos, de plantas medicinais e ornamentais com funções variadas, incluindo atividades de lazer, recreação, drenagem sustentável e mobilidade ativa”, detalhou Mishima.
O HIDS está localizado no que se convencionou chamar de área periurbana, na transição entre espaços estritamente rurais e áreas urbanas. O Entreterras se aproveita desta característica. A proposta é que o Centro e seus terraços atuem como zona de transição, suavizando a interação entre a matriz urbana dessa e os sistemas de áreas verdes do HIDS. Assim, Mishima propõe vias de fruição pública que atravessam o sistema de áreas verdes produtivas, acompanhando as curvas de nível e formando um passeiocontínuo para os pedestres ao longo da quadra, promovendo uma interação direta com a natureza. “Na escala do projeto, pátios cobertos, terraços com hortas comunitárias, passarelas e varandas garantem a permeabilidade visual das áreas de produção para os usuários do edifício, integrando as atividades internas ao ambiente natural”, complementou.
O Centro teria ainda blocos independentes, com várias entradas e uma praça central. Os diversos blocos foram idealizados para abrigar o processamento, operação e comercialização da produção agrícola e ainda um setor educacional, voltado para a pesquisa, oficinas e intercâmbio entre agricultores e empresas locais. O projeto inclui docas e armazéns para armazenar a produção agrícola, um galpão com equipamentos adequados para o processamento da produção agroalimentar cultivada no HIDS Unicamp, além de espaços cobertos e descobertos para a comercialização desses produtos, por meio de feira ao ar livre ou boxes de vendas de itens variados.
Em seu projeto, a arquiteta também adotou estratégias bioclimáticas, isto é, incorporou algumas soluções que buscam aproveitar condições favoráveis do clima e do local, de modo a gerar conforto interior e minimizar o consumo energético as salas de pesquisa foram posicionadas na fachada sudeste, alinhadas com a direção do vento dominante. No galpão de processamento e no setor de vendas e comércio, foram utilizados climatizadores evaporativos como método de resfriamento evaporativo de forma passiva. Além de proporcionar conforto térmico, essa estratégia prolonga a vida útil dos produtos comercializados como verduras e frutas.
*O projeto Entreterras: Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Agroalimentar foi elaborado com parte da disciplina de TFG. Ele não é um projeto formal da equipe de implantação do HIDS Unicamp.